O vale do rio Trombetas, oeste do estado do Pará, Brasil, é secularmente ocupado por
populações remanescentes de quilombos. Em 1979 e 1989 foram criadas nesta região,
respectivamente, a Reserva Biológica do Rio Trombetas (RBRT) e a Floresta Nacional Saraca-
Taquera (FNST), estabelecendo regras conflitantes com a realidade local. A promulgação do Art.
68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) em 1988 assegurou o direito de
propriedade das terras ocupadas pelas comunidades remanesceste de quilombo, iniciando desde
então uma disputa pelo espaço. Partindo-se da abordagem da Resolução de Conflitos delineou-se
como objetivo do estudo compreender os conflitos gerados a partir das Unidades de Conservação
e propor alternativas para sua solução. Por meio de pesquisa documental e observações diretas foi
possível investigar as posições e interesses das partes em conflitos. Verificou-se a partir dos dados
coletados a existência de três interesses específicos do órgão gestor, onze interesses comunitários
e quatro interesses compartilhados. Este resultado foi discutido em função dos cenários para
solução dos conflitos, que são: i) Reassentamento; ii) Desafetação da RBRT e Titulação de
Território Quilombola (TQ); iii) Desafetação da RBRT e criação de Reserva de Desenvolvimento
Sustentável (RDS); iv) Termo de Compromisso (TC); v) Desafetação da FNST e titulação de TQ;
vi) Recategorização da FNST como RDS. O reassentamento choca-se com o direito quilombola e
pode não trazer o resultado esperado. O segundo cenário choca-se com interesses compartilhados
e inviabiliza a RBRT como unidade de conservação (UC). A terceira alternativa permite dupla
afetação (UC e TQ no mesmo espaço) e mostrou-se apropriada para satisfazer interesses
compartilhados em algumas áreas. O TC mostrou-se como boa alternativa para áreas ocupadas
com usos, sem moradias, cuja solução do conflito pode ser obtida num longo prazo. A quinta
alternativa mostrou-se necessária para viabilizar recuos de interesses quilombolas na RBRT,
satisfazer interesses relacionados a maior autonomia e corrigir o fato da FNST ter sido criada após
o Art. 68 do ADCT. Por fim, não houve interesse comunitário na recategorização da FNST,
inviabilizando este cenário. Como conclusão o estudo mostrou que a resolução destes conflitos
sem prejudicar o núcleo essencial dos direitos enseja recuos de posição, definição de áreas
prioritárias com base em alvos de conservação, barganhas e implementação de novos arranjos
institucionais que fomentem cooperação por meio de interesses compartilhados.
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