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FAUNA SUBTERRÂNEA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE: CARACTERIZAÇÃO E IMPACTOS

Autores

FERREIRA, Rodrigo Lopes1, PROUS, Xavier 2, BERNARDI, Leopoldo Ferreira de Oliveira 3 & SOUZA-SILVA, Marconi.

Ano de Publicação
2010
Categoria
PESQUISA AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO DA BIODIVERSIDADE
Descrição

RESUMO Estudos referentes à fauna das cavernas do nordeste brasileiro ainda são escassos. Boa parte do conhecimento acerca da fauna hipógea brasileira provém de estudos realizados na região sudeste. Deste modo, neste trabalho são apresentados dados sobre a riqueza de espécies, estrutura das comunidades, além da relevância biológica de algumas cavernas presentes no estado do Rio Grande do Norte. Nas 17 cavernas inventariadas foram encontrados invertebrados pertencentes a pelo menos 36 ordens e 91 famílias, além de 3 espécies de peixes e 8 espécies de morcegos. Dentre as espécies encontradas, 23 apresentam caracteres troglomórficos. Além disso, algumas das espécies troglóbias evidenciadas representam relictos de grupos originalmente oceânicos, sendo, desta forma, testemunhos das introgressões e regressões oceânicas ocorridas no passado da área. Tendo em vista o cenário bioespeleológico encontrado nas cavernas é importante que ações de manejo e conservação sejam implementadas na região, para que o frágil patrimônio espeleológico e biológico venham a ser preservados.

Palavras-chave: cavernas, invertebrados, conservação, Rio Grande do Norte.

SUBTERRANEAN FAUNA OF THE STATE OF RIO GRANDE DO NORTE: CHARACTERIZATION AND IMPACTS

ABSTRACT There is a lack of studies concerning the cave fauna in Northeastern Brazil. The information related to Brazilian cave fauna was mainly provided by studies performed in the Southeast region of the country. The aim of this study is to provide data related to the richness, structure of communities, and biological relevance of some caves located in the state of Rio Grande do Norte. A total of 91 families of invertebrates, distributed among 36 orders, were sampled from 17 caves. It was also observed 3 species of fish and 8 species of bat in these caves. From the sampled organisms, 23 presented troglomorphic traits. Some of the troglobites (cave dwelling) are relicts of previous oceanic sea life, therefore, being evidence of oceanic introgressions and regressions that occurred in the past of the area. Since the area is extremely important in the national speleological context, conservation strategies must be defined to protect the caves and their life.

Key words: caves, invertebrates, conservation, Rio Grande do Norte.


INTRODUÇÃO

O termo ―caatinga‖ é de origem Tupi e significa ―mata branca‖, referindo-se ao aspecto da vegetação durante a estação seca, quando a maioria das árvores perde as folhas e os troncos esbranquiçados e brilhantes dominam a paisagem (PRADO, 2003). Caatinga é um complexo vegetacional no qual dominam dois tipos de vegetação: um constituído de arvoretas e arbustos decíduos durante a seca e freqüentemente armados de espinhos (acúleos), e outro de cactáceas, bromeliáceas e ervas quase todas anuais (LEAL et al 2005, RIZZINI 1976). Trata-se de uma região seca, muito quente, de posição subequatorial e dotada de acentuada intermitência sazonal. A caatinga ocupa uma área aproximada de 734.478 km2, cerca de 9,92% do território nacional e é o único bioma exclusivamente brasileiro. Isso significa que grande parte do patrimônio biológico dessa região não é encontrada em outro lugar do mundo exceto no nordeste do Brasil (SILVA et al., 2004).

A grande heterogeneidade ambiental do bioma Caatinga e a singularidade de certos ambientes permitem prever que a fauna de invertebrados deste bioma seja riquíssima, com várias espécies endêmicas. Entretanto, o aspecto mais relevante na análise dos poucos dados existentes sobre invertebrados da Caatinga é o conhecimento insuficiente. Há, portanto, uma necessidade urgente de melhorar significativamente o conhecimento sobre os invertebrados desse bioma, principalmente ao se considerar a atual tendência mundial na escolha deste grupo de organismos como indicadores de qualidade ambiental (SILVA et al., 2004).

A Caatinga é hoje considerada um dos biomas brasileiros mais alterados pelas atividades humanas, sendo que 68% de sua área está sob alguma influência antrópica. As causas das modificações são múltiplas e complexas, como a exploração de madeira para combustível e a substituição da vegetação nativa por práticas agrícolas inapropriadas (SILVA et al., 2004). O principal problema para a conservação da Caatinga é que as áreas não impactadas não formam uma mancha única, estando divididas em 1.043 ilhas de vegetação, sendo que apenas 172 delas têm áreas com mais de 10 quilômetros de largura (GERAQUE, 2007). Além de todas as características mencionadas, a caatinga abriga as maiores cavernas do país. Das 30 maiores cavernas brasileiras ,já reconhecidas, 14 encontram-se nos domínios desse bioma (AULER et al., 2001).

O ambiente cavernícola apresenta algumas características bastante peculiares, isso quando comparado ao ambiente epígeo. Dentre estas características podemos citar a ausência permanente de luz e a tendência na estabilidade das condições ambientais, tais como temperatura e umidade (CULVER, 1982).

A ausência permanente de luz no interior das cavernas impossibilita a ocorrência de organismos fotossintetizantes. Dessa forma, na maioria das cavernas, os recursos alimentares disponíveis para fauna residente têm de origem alóctone (CULVER, 1982; SOUZA-SILVA, 2003). Sendo a entrada destes recursos feita especialmente pela importação promovida por rios, enxurradas, cursos d’água ou por águas que percolam pelo teto ou paredes e através de aberturas ou fraturas que eventualmente existam nas cavernas (GILBERT et al, 1994). Além disto, animais que habitualmente utilizam as cavernas como abrigos ou penetram acidentalmente e

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morrem nestes ambientes, podem ter seus cadáveres utilizados como recursos alimentares por outros organismos (FERREIRA, 2005).

A pequena disponibilidade de recursos nas cavernas é um fator limitante ao estabelecimento de inúmeras espécies nos ecossistemas subterrâneos (CULVER, 1982). De forma geral, as cavernas são comumente caracterizadas como ambientes que tem tendência ao oligotrofismo, já que, geralmente, as vias de importação não costumam ser suficientemente eficientes e tendem a não transportar grandes quantidades de recursos. Deste modo, os organismos que vivem no meio hipógeo devem apresentar adaptações morfológicas, fisiológicas e comportamentais, geralmente ligadas às limitações físicas e à escassa disponibilidade alimentos (CULVER, 1982).

Uma vez que as cavernas são ambientes conectados (em maior ou menor grau) aos sistemas externos, as interferências sobre o meio físico decorrente de fenômenos naturais ou da ação antrópica refletem-se diretamente sobre as cavernas. A desestruturação dos sistemas cavernícolas, por sua vez, pode causar várias modificações no sistema externo, acentuando ainda mais o estado de desequilíbrio de um dado ecossistema. Como exemplo, pode-se citar enchentes (LISOWISKI & POULSON, 1981; LEWIS, 1982) ou mesmo a diminuição da água em drenagens hipógeas (ELLIOT, 1981).

A fauna cavernícola brasileira começou a ser melhor estudada a partir da década de 80, principalmente em cavernas calcárias e localizadas nos estados de São Paulo, Goiás, Bahia, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso, além de um pequeno número de cavidades no Ceará (DESSEN et al., 1980, PINTO–DA-ROCHA, 1995). No entanto, poucos estudos ecológicos foram realizados, sendo a maioria estudos zoológicos e simples levantamentos faunísticos (DESSEN et al., 1980; FERREIRA & HORTA, 2001). Estudos relativos à fauna cavernícola da Caatinga são restritos ao estado da Bahia (TRAJANO, 1987; FERREIRA, 1998; FERREIRA & MARTINS, 1998; FERREIRA, 2004). Em relação à fauna das cavernas do Rio Grande do Norte, quase nada é conhecido (KRAMER, 2008).

O conhecimento da biota cavernícola na Caatinga ainda é incipiente. Assim, estudos de identificação dos grupos e características ecológicas das cavernas são primordiais para o planejamento de ações de conservação destes ambientes na Caatinga.

Assim, este estudo teve como objetivos levantar as características biológicas, tróficas, físicas e de uso antrópico de algumas cavernas calcárias do Rio Grande do Norte, com a finalidade de inventariar as espécies de invertebrados, promover a caracterização trófica das mesmas e construir sugestões emergenciais de uso futuro das cavernas. Para tanto, pretendeu-se:

1. Identificar os taxa associados a algumas cavernas do Rio Grande do Norte;

2. Verificar a presença e status populacional de espécies subterrâneas ameaçadas de extinção ou endêmicas;

3. Identificar as principais ameaças antrópicas impostas às comunidades cavernícolas estudadas.


Tipo de publicação
Publicações periódicas (revistas, jornais, boletins)
Local da publicação
Brasília, DF
Nº da edição ou volume
Revista Brasileira de Espeleologia – RBEsp, v. 1, n. 1, 2010
Editora
CECAV - ICMBIO
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