Até o final da década de 70, praticamente não havia informação sobre as tartarugas marinhas no Brasil. Levantamento realizado no início dos anos 80 identificou as áreas de reprodução no litoral e confirmou a ocorrência de cinco espécies, todas elas prestes a desaparecer. O s pesquisadores também chegaram a outra conclusão: qualquer plano para a conservação das tartarugas marinhas estaria condenado ao fracasso sem a participação das comunidades costeiras. Os pescadores eram os maiores entendidos no assunto - afinal, dependiam desse conhecimento para explorar o recurso natural como meio de sobrevivência, pelo uso direto de ovos, fêmeas e casco. Ensinaram o que sabiam aos biólogos e com eles aprenderam a cuidar dos bichos. Assim, as primeiras bases de pesquisa foram criadas, nas principais áreas de reprodução. Essa foi a primeira troca. Depois, vieram muitas outras, possibilitando a mais de uma geração a mudança de comportamento com bases sólidas na sustentabilidade, através da geração direta de emprego e renda. Diante dos avanços, novas ações foram agregadas às comunidades costeiras, de acordo com a realidade de cada uma. N a busca de compreender cada vez melhor o ciclo de vida desses animais, o TAMAR foi estendendo suas atividades e ampliando o conhecimento disponível. A coleta de dados sistematizada, através da marcação das fêmeas e parâmetros de incubação dos ninhos, e os estudos de comportamento na fase de desova, por exemplo, modernizaram as possibilidades de análise e avaliação do trabalho. Desenvolveram-se novas técnicas de pesquisa, ajudando a desvendar aos poucos alguns mistérios das tartarugas marinhas. O rastreamento por satélite revelou suas rotas e comportamento no mar; estudos genéticos demonstraram as diferenças entre as populações; um novo sistema de informação integrado foi criado e desenvolvido, facilitando o acesso ao banco de dados. I ntensificaram-se a pesquisa e as ações sobre a captura incidental nas diferentes pescarias, na costa e em alto mar, com a implementação de medidas mitigadoras para diminuir o índice de mortalidade. Mas há outras ameaças: o desenvolvimento desordenado na costa, a poluição (principalmente o lixo nas praias e no mar) e possíveis impactos provocados pelas mudanças climáticas criaram novos desafios na busca de soluções capazes de conciliar o desenvolvimento com as necessidades das espécies. C erca de 1.300 pessoas das comunidades costeiras estão envolvidas nas atividades do TAMAR, que mantém programas de sensibilização e educação ambiental. Ao gerar empregos e promover alternativas de renda, o Projeto cria uma nova realidade em que se pode comprovar objetivamente: “Mais vale uma tartaruga viva do que morta”. A proteção integral de fêmeas e ninhos foi o primeiro resultado biológico positivo alcançado nas principais áreas de desova. Restabelecia-se, dessa maneira, o ciclo de vida há anos interrompido pela ação do homem. Mais tarde, graças ao trabalho desenvolvido regularmente nas praias, o Projeto registrou um começo de recuperação das populações de três espécies: cabeçuda (Caretta caretta), de pente (Eretmochelys imbricata) e oliva (Lepidochelys olivacea). M ais de um milhão de filhotes das cinco espécies nascem e são liberados ao mar, anualmente, sob a proteção do TAMAR, totalizando 11 milhões, até a última temporada 2010/2011. Por serem animais migratórios, de ciclo de vida longo, as tartarugas marinhas passam a maior parte do tempo no mar (só as fêmeas sobem à praia para desovar) e podem atravessar oceanos, para se alimentar em águas próximas a um continente e se reproduzir em outro. Essa complexidade exige ações integradas internacionalmente. O Brasil está fazendo sua parte, naturais compartilhados entre nações. M as ainda há muito por fazer. Este Plano de Ação Nacional-PAN revela o conhecimento acumulado pelo TAMAR, em 30 anos de atuação, como registram os trabalhos científicos produzidos e artigos publicados. Principalmente, aponta alguns caminhos para o futuro, pois a missão ainda não está concluída: em maior ou menor grau, todas as cinco espécies de tartarugas marinhas que ocorrem no Brasil continuam ameaçadas de extinção. gUY GUAGNI DEI MARCOVALDI Coordenador do Centro Nacional de Conservação e Manejo de Tartarugas Marinhas |